O ano de 2021 termina com um contexto político marcado pela descontinuidade, em face da realização de eleições antecipadas em janeiro. Esta “paragem” é uma oportunidade para refletir: que país queremos ter? Que oportunidades queremos deixar para os nossos filhos?
Os diagnósticos sobre a evolução e perspetivas de crescimento económico para Portugal têm sido, infelizmente, desoladores. Portugal está longe de apresentar um nível de intensidade capitalística comparável ao das economias mais robustas da UE, e tem investido bastante menos que muitos outros países (que têm também crescido mais do que nós).
Como fatores explicativos desta situação, apontam-se níveis de capital/investimento muito reduzidos, endividamento ainda muito elevado, fiscalidade e custos de contexto pouco competitivos, entre diversos outros fatores que não cabem nesta minha análise.
Temos que tomar consciência que temos que fazer diferente, ou não vamos mudar o rumo desta situação em que nos encontramos.
E também no mercado de capitais!
No final de 2020, a OCDE apresentou um diagnóstico profundo e um receituário muito completo, sobre como poderemos colocar o mercado de capitais ao serviço do investimento e do crescimento da economia. Durante o ano de 2021, trabalhou uma Task Force, sob a coordenação do Governo, que transformou as orientações da OCDE em medidas concretas, muitas já sob a forma de propostas legislativas (prontas a adotar). Estas propostas resultam do trabalho e contributo de uma diversidade de entidades participantes e conhecedoras do mercado, incluindo empresas emitentes, investidores, intermediários financeiros, entidade gestora do mercado e reguladores.
O trabalho está feito e não deveríamos perder mais tempo. Este é um apelo que deixo, não apenas ao novo Governo, seja ele qual for, mas a todos aqueles que querem ter um país mais produtivo e mais próspero, que se empenhem na defesa de um mercado de capitais mais atrativo e, portanto, na adoção das medidas para o concretizar. Temos todos que ser mais exigentes e empenhados.
O ano de 2021 foi marcado por um nível de atividade muito elevada no mercado de capitais na Europa, e na Euronext o ano mais ativo dos últimos 10 anos. Entraram 212 empresas nos nossos mercados, que levantaram mais de 21 mil milhões de euros. E também as empresas já cotadas aproveitaram este contexto muito favorável, para fortalecerem os seus capitais, em cerca de €80 mil milhões, cerca de 5 vezes o que se havia registado em 2019 (pré-pandemia).
Algumas empresas portuguesas cotadas aproveitaram este momento do mercado para reforçarem os seus capitais e para se prepararem para novos ciclos de investimento – foi, designadamente, o caso da EDP, da EDP Renováveis, da Greenvolt, Sonae Indústria, Mota Engil, Ibersol e Flexdeal, que, no total, terão levantado cerca de três mil milhões de Euros. Estas operações, algumas de montante elevado à escala internacional, mostram que o mercado de capitais é uma opção viável e deveria servir muito mais empresas em Portugal.
O ano que agora termina também foi marcado pelo crescimento e inovação ao nível das finanças sustentáveis, designadamente com a emissão de obrigações com remunerações ligadas a indicadores ambientais e sociais. A Mota Engil emitiu uma obrigação ligada à redução de acidentes de trabalho (um objetivo social), e a primeira ESG Bond com distribuição pelo retalho. Este tipo de instrumentos continua a revelar uma procura crescente, e consequentemente, taxas mais atrativas.
No início de novembro a Euronext apresentou o seu plano estratégico designado Growth for Impact 2024. Este plano vem reforçar a posição da Euronext enquanto a infraestrutura líder de mercados na Europa, mas também o propósito e o compromisso da Euronext com o cumprimento dos objetivos do Acordo de Paris, e com a promoção do equilíbrio social. São definidos objetivos e planos de ação não somente para a Euronext, enquanto empresa que quer liderar pelo exemplo, como é colocado um particular esforço no desenvolvimento dos produtos e serviços que vão facilitar a canalização das poupanças e do investimento no mercado, para os objetivos da sustentabilidade.
Volto a lembrar que a fazer mais do mesmo, não mudamos a realidade que temos. Queremos que o ano de 2022 traga mais investimento e crescimento, mas todos temos que fazer a nossa parte.
Bom ano!